(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

27.9.11

Viagem … ao centro de mim

   A solidão assusta. Não só na vida em geral, mas nas viagens também. Começam, aos poucos, a proliferar as viagens a sós, muitas delas organizadas por agências vocacionadas para excursões a solo… mas em grupo!  E isso não é viajar sozinho, mas na companhia de desconhecidos que em breve  se tornarão companheiros de viagem… Assim é fácil…
   A solidão assusta. Sobretudo quando, lançados ao mundo, percorremos caminhos desconhecidos; enfrentamos desafios não previstos e descobrimos, perante a mais fabulosa paisagem, estar a contemplá-la a sós, sem a alegria da partilha que nos exponencia as sensações…
  E a solidão assusta porque sabemos que só contamos connosco e que, se algo correr menos bem, apenas nos restará contar com o milagre da solidariedade alheia. Mas uma viagem a sós ( daquelas marcadas na net com a convicção de não se querer ir em excursão) tem a  sua  mais temida face no tempo passado com nós mesmos… Mais que tudo o resto, é isto que nos assusta, ou pelo menos é o que tenho entendido de todos quantos, espantados, me dizem que jamais seriam capazes de fazer o que eu faço….!
  Tudo começou numa manhã de Domingo, sentada ao computador. A vontade de partir já cá estava, mas não queria partilhar o meu tempo e espaço com ninguém.  – “ Para onde vou?” – Perguntei-me. – “ Conheço meio Mundo e nunca visitei o Louvre…É isso! Vou para Paris!” -  Meia hora depois tinha os voos marcados, o hotel escolhido e o planeamento dos meus dias relativamente bem estruturado.  Por momentos pensei em convidar alguma amiga, mas o friozinho no estômago estava a saber-me tão bem que percebi que aquela viagem era mesmo só para mim:  para estar comigo… em Paris.
  Uma semana mais tarde, ao sentar-me no avião, percebi que, apesar das incontáveis vezes que me elevara nos céus, jamais o havia feito apenas comigo. Revi mentalmente tudo o que tivera de deixar preparado para a minha ausência: quanto ao trabalho, quanto à casa e aos filhos… mas depressa percebi que queria deixar tudo em casa, como que tirando umas férias da vida. Ainda bem que assim fiz ou teria corrido o risco de partir só com o corpo, deixando a alma para trás…  Mas não! Eu fui inteira! Ou pelo menos assim o pensava  ao chegar, maravilhada, à cidade Luz!
  Quando se viaja sozinha tudo tem outro encanto:  responsabilizamo-nos em absoluto por nós num silêncioso pacto de zelosa  protecção; seguimos ao nosso ritmo e divagamos, com ou sem destino, ao sabor da nossa vontade; respeitamos as regras por nós impostas, mas com a satisfeita leveza de nos sabermos senhores da nossa própria vontade e experimentamos a egoísta vivência de tudo saborear com um encantamento infantil de quem não se cansa, mesmo quando o corpo já não pode dar mais um passo…
Por isso devolvo o meu espanto a quem se admira por eu partir sozinha pelo Mundo, dizendo que jamais seria capaz… como podem negar-se a experimentar? Como podem pensar que é assustador e desconfortável?  Como podem não dar, sequer, uma condescendente hipótese à viagem que poderia abrir, mais que os vossos horizontes, as portas do vosso interior?


É por isso que não, a solidão não assusta! Só a pode temer quem  pense que não se tem a si mesmo!
  E apenas digo isto porque nessa primeira viagem a sós, sem mais companhia que a minha,  vivi um reencontro inesperado que me devolveu a mim mesma….houve segredos revelados de dentro para fora, num conhecimento mais pleno e profundo,… numa beleza tão rica quanto o destino escolhido… E é na bela paisagem do nosso interior que realmente fazemos a mais perfeita viagem… aquela nos muda e regenera e poderá muito bem ficar gravada na nossa memória como a viagem da nossa vida!
Como nessa semana em Paris… Nessa viagem… ao centro de mim…

Ana Dias

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