Mais um dia passado pela vida em que não admiti que ela passasse por mim sem lhe deixar algo de valioso. A correria matinal, seguida de levar os dois diabretes à escola e a alegre chegada ao café onde todas as manhãs tomo a meia de leite e escrevo as estórias que na alma se me formam. Mais tarde, satisfeita e refeita pela criatividade derramada, segui para o resto dos afazeres agendados para hoje. Enquanto guiava vi um homem sentado no muro da igreja de uma pequena povoação onde quase todos os dias passo. E ele quase todos os dias está ali, a ver os carros passar, no seu sereno e misterioso hábito recheado de nada ( a verdade é que passa ali os dias sem nada fazer…). Julguei-o. Julguei-o na sua inércia e desocupação de homem novo que podia estar a fazer pela vida, pela sociedade, por si mesmo… Julguei-o e comparei-o comigo que não consigo parar quieta dois minutos; que não consigo deixar de pensar em cinco novos projectos quando já tenho uns oito em mãos. Comparei-o com a minha velocidade impaciente ( na vida, não na estrada, ok?) de quem quer fazer a diferença, marcar posição, atingir almas, corações; crias sorrisos, harmonia; fazer mais e mais e mais….
E foi então que percebi que quem vê tudo sempre com os mesmos olhos, vê mais ou menos o mesmo que um cego (só que os cegos normalmente são-no só dos olhos, não da alma!). Percebi naquele momento, no meu carro ( eu percebo tanta coisa no carro!!) que estava a ser estúpidamente preconceituosa… Estava a ser julgadora quando isso não me é pedido nem esperado. Quem sabe se o senhor não é um pensador ilumidado ( ao estilo do nosso adorado Osho) que escolhe sempre o mesmo lugar para as suas extraordinárias meditações que o conduzirão à transcendência e a ser, quem sabe, um grande contributo para a evolução da humanidade… Afinal, como diz a minha amiga Marta – “ às vezes de fraca moita, salta grande coelho!!”. Ou, quem sabe, o senhor do muro da igreja talvez ali esteja para ajudar as crianças a atravessar a estrada em segurança ou com a missão de evitar algum grande acidente e salvar a vida a alguém a quem viver faça falta…. ( esta talvez pareça uma estupidez mas, se pensarem um pouco, talvez percebam que não é…)
O certo é que segui para o resto do meu dia decidida a olhar para tudo com mais do que um olhar, que é como quem diz, decida a conseguir ver tudo sob vários prismas, direcções, iluminações. Tentar ver tudo com novas cores e nuances que não apenas as óbvias… usar os olhos do corpo e, depois, accionar também os do coração da alma e de tudo o que mais haja cá dentro…. Porque só assim é que podemos ver as razões dos outros mesmo quando achamos que eles não têm razão e isto é muito importante porque não só vai esbater conflitos e potenciar a harmonia como nos vai “limpar” por dentro de todos os sentimentos corrosivos e nefastos que não queremos em nós!
E é por isso que estou a escrever sobre os cotovelos, deitada de barriga para baixo, virada para os pés da cama… é por isso que mudei a cor das lâmpadas dos candeeiros e pus uma música inspiradora bem alto na aparelhagem…. Para olhar para tudo com novos olhos e uma nova perspectiva tudo, mas mesmo para tudo!!!
…. E agora vou pôr mais baixo… que os miúdos já devem ter adormecido.
Ana Dias
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