(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

23.6.13

Obrigada

Obrigada

A ser verdade que a vida só começa aos quarenta, resta-me esperar mais um ano. Esperarei com a paciência irrequieta de quem se prepara, de todas as formas possíveis, para algo grandioso. Esperarei em movimento, em ação, em aprendizagem, encantada com o belo e a querer tornar bom o que é mau.
A ser verdade (e isto é mesmo!) que a beleza e a jovialidade interior são mais importantes que as exteriores, só posso sentir-me mais bela que nunca. Mais sábia, mais capaz, mais preparada. Estou certa que, de todas as bênçãos com que já fui brindada, uma das mais magníficas é a de ter descoberto o sentido mais profundo da minha existência. É por isso que o partilho convosco. Diariamente . Em palavras e dias escritos.
A todos os que me acompanham, lêem, entendem e inspiram (sim, são mesmo vocês a minha inspiração!) quero deixar o meu muito obrigada.
A todos um forte abraço!

Ana Amorim Dias

La escritora

La escritora

Ontem à noite estive imenso tempo na esplanada do "Piratas" a conversar com um sevilhana interessantíssima. Dona de uma cultura impressionante e permitindo-me aceder à sua contagiante paixão pela vida, proporcionou-me um serão deveras aprazível.
Mas o acontecimento digno de nota chegou mais para o fim da noite, quando o seu marido reclamou que queria ir para casa.
- Pero estarás loco?? Estoy hablando con una escritora y quieres que me vaya?!?-
Deliciei-me completamente naquele momento. Mas encantei-me ainda mais ao lembrar-me que antes também eu me emocionava ao falar com um escritor. Tornei-me naquilo que mais admiro!

Ana Amorim Dias

Quando for grande

Quando for grande

- O que é que queres ser quando fores grande?-
- Quero ser carismático.-
Normalmente os miúdos querem ser polícias ou bombeiros. Nem sei se o carisma é algo que se possa aprender a ser, ou uma condição já contratada pela alma ao nascer.
Procurei o significado de carisma em vários dicionários. Não transcrevo nenhum porque me parecem todos incompletos. Carisma é algo indefinível por si mesmo; é um conjunto de características indecifráveis para as quais dificilmente nos podemos treinar.
No entanto, e de forma bem paradoxal, as pessoas carismáticas identificam-se sem qualquer dificuldade: são sóis que brilham sempre, onde quer que se encontrem.

Ana Amorim Dias

A troca

A troca

Há muitos anos que não me lembrava da sensação que os exames causam. Graças aos do Tomás voltei a ter uma ténue recordação, devido ao facto de o ter ajudado um pouco a preparar-se para o exame de português.
- Podes parar de explicar tanta coisa, mãe? Já tenho a cabeça quentinha!-
O raio do moço é tão doce que em vez de dizer, como eu, que tem o cérebro a fritar, diz que tem a cabeça quentinha!
- Mãe?-
- Diz.- respondo, entre advérbios e pronomes.
- Fixe, fixe, era no dia do exame trocarmos de cérebro!-
Interrompo-lhe a maluqueira e regresso às explicações. Mas claro, depois fico a pensar! Trocaria eu de cérebro com alguém? Se fosse a um título muito fugazmente transitório era capaz de ser giro fazê-lo com pessoas como o Stephen Hawking, por exemplo. Mas ainda bem que isto é só ficção científica porque gosto demasiado da maneira como o cérebro funciona para colocar isso em risco.
O certo é que a esta hora o meu filhote mais velho está a começar o exame de português. Não trocamos de cérebro como esta crónica bem comprova. O que trocamos sempre são afetos, conhecimentos e experiências. E o que eu lhe costumo dar é espaço para que possa usar o seu corpo e a sua mente de forma a que, no futuro, alguém lhe venha a dizer: - Pai? Fixe, fixe era trocarmos!-
Boa sorte filho. E não stresses muito, um dia hás-de escrever sem erros!

Ana Amorim Dias

Salvo-conduto

Salvo-conduto

A sensação de vir de outro continente e aterrar numa qualquer cidade europeia costumava fazer-me sentir segura e em casa. Era uma coisa automática, quase celular.
A sensação de viver, há quase trinta e nove anos, em paz e sem medo não tem preço. Respirar a liberdade democrática é algo que sempre tomei por garantido, algo que respeito com uma reverência tão agradecida que nem sei como expressar.
A sensação de viver numa Europa económica e socialmente cada vez mais desarranjada, começa a fazer-me temer por coisas que nunca antes receei.
Viver em mais um país de políticos maioritariamente gulosos em que a educação, a saúde, a segurança social, os valores e a estrutura económica em geral estão a colapsar diante dos nossos olhos, faz nascer em mim considerações que até agora preferi afastar. O caos às vezes traz ordem. Mas a que tipo de ordem é que nos estamos a habilitar?
Creio que todas as atrocidades ocorridas no século passado na Europa, se mantêm bem presentes nas mentes de cada adulto informado. Os acontecimentos dos últimos dias, na euro-asiática Turquia, fazem-me temer o pior. O início do fim da liberdade de expressão é o fim do que devia ser o início da evolução do Homem na sua dimensão social.
Estaremos a caminhar de novo para o fim da democracia? Nunca antes me tinha permitido esta dúvida. Agora começa a fazer sentido duvidar.
Resta-me um apelo, singelo e sentido. É nas mãos das autoridades, policiais e militarizadas, que se encerra o derradeiro poder de evitar a morte das liberdades mais básicas. Apelo a que pensemos um pouco nisto e a que comecemos uma carinhosa campanha, perante todos os agentes de autoridade que conhecemos: há que fazê-los pensar antes de obedecer cegamente. Talvez desta forma estejamos a garantir o salvo-conduto que nos permitirá, no futuro, continuar a poder dizer e manifestar os valores em que acreditamos.

Ana Amorim Dias


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O heróico ato de ensinar

O heróico ato de ensinar

Ensinar é a apoteose do heroísmo. Não consigo recordar-me de missão mais nobre do que transmitir conhecimentos, a não ser, talvez, a de salvar vidas. Se bem que ensinar é também isso: resgatar vidas à ignorância que torna os seres frágeis e indefesos.
Qualquer civilização sã e próspera tem que se alicerçar em pessoas com conhecimentos e uma capacidade de pensar suficientemente consolidados para executarem condignamente o seu papel não só na vida profissional como na sua participação social.
Recuso-me a acreditar (ingenuamente talvez) que o poderio que nos tem governado tenha interesse num povo embrutecido por um ensino decadente, antiquado e desajustado à realidade galopantemente mutável destes tempos que vivemos.
Recuso-me a acreditar que não se abram, em breve, os olhos de quem manda, e que os professores tenham que continuar a perder tempo e energia a preencher quilos de papel e a tentar provar que estão aptos para ensinar, em vez de se poderem dedicar ao que já pouco têm hipótese de fazer.
Andei na escola entre 1980 e 1997. Não foi assim há tanto tempo. Nem digo que fosse perfeito. Levei duas reguadas, aprendi alguma coisa e nunca os meus pais questionaram a autoridade e razão dessas pessoas fantásticas cujos nomes, vozes e caras continuo a recordar. Nessa altura havia testes e classificações. Quem sabia passava, quem não sabia chumbava. E depois ia-se de férias sem mais exames-palhaçada.
As aptidões dos professores mudaram? Não me parece. Mudou a sua motivação e energia. Mudou a sua atitude heróica, vencida pelo desrespeito vindo de todos os lados; espancada por currículos desajustados; esmagada pelos quilos de papeis a preencher e provas a dar às pessoas erradas! Os mestres existem para os discípulos. A escola serve para os alunos aprenderem e isso implica deixar os professores ensinar! Parece-me bastante simples.
Se concordo com esta greve? Isso não é importante. Há razões e desrazões de parte a parte. Só é pena que se tenha que chegar ao ponto de tentar solucionar a educação de um país com braços de ferro que prejudicam, mais que tudo, aqueles que era suposto serem os beneficiários da educação.
O certo é que cada vez mais me apercebo que o ensino é, para quem nele manda, um jogo que se joga à sorte, com o despudor de quem não quer ver a sua importância. É isto que me leva a crer que se não começar eu a tomar seriamente nas minhas mãos a formação dos meus filhos, poucas hipóteses terão de obter sólidas bases. É triste. De todas as formas possíveis.

Ana Amorim Dias



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Novas riquezas

Novas riquezas

Vinha no carro a dar voltas ao pensamento. Não tinha tema para hoje. Pelo menos nada que me estivesse a entusiasmar o suficiente para poder escrever apaixonadamente.
Por isso a cara que o João fez veio mesmo a calhar. Entrou no recinto onde se concentram, antes de irem para as respetivas atividades, todos os miúdos que frequentam as férias ativas. Olhou à volta com uma expressão desencantada e deixou-se ficar ali no meio, com a mochila nas costas e, aposto, algum desalento no coração.
Baixei-me um pouco e falei-lhe ao ouvido para me fazer escutar no meio da gritaria.
- Não ter amigos por perto é uma grande prenda, sabes? É assim que se fazem amigos novos!-
E pronto, vim-me embora. A carinha um pouco triste não me comoveu nem um pouco: tem quinze dias para fazer nascer amizades e, mesmo que não tivesse aquela personalidade expansiva que cativa toda a gente, estaria perante uma oportunidade excelente de começar a treinar.

Ana Amorim Dias