(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

16.9.13

Guerreira

Guerreira

- Tinhas razão, Ana!- disse-me ele com um sorriso radiante.
Há uns tempos atrás eu dissera-lhe que, no fim, a conversa dos noivos é sempre a mesma: "Superou muito as nossas expetativas!" Assegurei-lhe que ele não seria exceção e me diria exatamente o mesmo, no final da sua festa.

Não faço pinturas de guerra nem uso camuflagem, ou melhor, se calhar sim: uma sombra suave e rímel nos olhos; uma roupa minimamente elegante que se conjugue bem com confortáveis botas de montanha (sim, é possível!), e estou pronta para a batalha!

Esta alegoria usa a guerra de uma forma diferente, não sangrenta, em que o belicismo nada mais é que do que a nossa determinação em sermos muito bons no que fazemos. Reconheço a tremenda sorte que tenho por adorar todas as minhas batalhas laborais. Há, no entanto, algumas que intimidam ao ponto de quase me roubarem o sono e me fazerem pensar que sou louca por aceitar assumir tão assustadores desafios. Sei que a minha vida não corre perigo, mas há por vezes em jogo valores de quase igual importância, como a honra, a competência e o nome. A realidade é que, no mercado empresarial, honra, competência e nome, equivalem à vida!

Preparação
Ninguém no seu juízo perfeito se deve lançar numa guerra sem o máximo de preparação possível. Muito treino. Armas preparadíssimas e mil vezes verificadas. Tropas bem motivadas, apaixonadas pela causa. Estratégia, planeamento. E munições! Munições em quantidade suficiente para garantir a vitória.

Nos primeiros anos ficava um pouco nervosa no momento em que a Quinta do Monte era invadida por "hordas de cossacos" esfomeados e sequiosos. Depois aprendi que o truque estava na extrema preparação... Mas não só...

Mentalização
Nenhuma tropa, por muito bons que os soldados sejam, consegue ganhar a guerra se for conduzida por um líder inseguro e desorientado. Um líder não tem só que ir à frente dos seus soldados, com bravura e inteligência; um líder tem que saber decidir tudo a todo o momento e, acima de tudo, tem que sentir-se guerreiro e inspirar a máxima confiança a quem o segue.


Podem vir 30 ou 300. É sempre uma "guerra". Nunca me permito colocar em causa a honra, a competência e o nome "Quinta do Monte"! Tudo tem que ser perfeito. Tudo tem que superar as expetativas. Por isso, quando os comensais começam a chegar, renovo o entusiasmo das tropas para os encherem de munições feitas de comida, bebida e simpatia; e transformo-me de novo na guerreira que tanto adoro ser.

Ana Amorim Dias

A caminho da escola

A caminho da escola

- Meninos?-
- Diz, mãe.-
- O que esperam do ano letivo que hoje começa?-
Íamos a caminho das suas escolas e a excitação já os deixara bem despertos mas, apanhados de surpresa, só responderam disparates.
- Não, não, não! Nada disso! O que vocês devem esperar e ambicionar é uma coisa só: conhecimento!-
- Sim, mãe...-
- Uma das coisas mais valiosas que podemos possuir, guardamo-la aqui- bati com o indicador nas têmporas- o conhecimento é uma das ferramentas que mais vantagens nos pode dar em qualquer situação, percebem? Devem lutar por obtê-lo e guardá-lo bem. E por treinar ao máximo a vossa capacidade de pensar.

Ao vê-los, pouco depois, a caminhar para as escolas, com as suas mochilas às costas, fiquei a torcer para que se lembrem todos os dias disto: da importância de tentar fazer do cérebro uma esponja.

Ana Amorim Dias

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Sublimes comunhões

Sublimes comunhões

Quando os conteúdos são mais arrojados, gosto de avisar primeiro, não vá algum incauto púdico ler o que não queria.
Apesar de usar palavras suaves, antes de me iniciar na divagação, deixo o alerta: se lerem para além destes dois parágrafos, é por vossa conta e risco.

Parece que, na Rússia, andam a aparecer lições para quem queira aprender ou aperfeiçoar a "arte" do fellatio. Até aqui nada de novo, pelo menos na minha despreconceituosa forma de ver as coisas. Ora a razão de ser desta crónica nem é o fellacio em si e sim a reação de horror que a notícia de tais aulitas desencadeou em certos seres. Não bastando invocar que tais práticas levam à alienação e perda de identidade da mulher, bem como à miséria humana, a massa crítica ainda se fartou de "bater" (quem quiser pode rir agora com a bela escolha verbal) nos pobres russos, alegando serem uns desalmados materialistas sem qualquer espiritualidade. Conheço bastantes russos e, tanto quanto sei, apesar de um pouco ruidosos e loucos, são extremamente hospitaleiros e dados.
Mas voltemos às lições de fellatio! Para quê tanta indignação? Não são aulas sobre como praticar nenhum crime e quem tem vontade de aprender a fazer melhor as coisas deve sempre investir no desenvolvimento das suas habilidades, certo? Haverá perda de identidade da mulher pelo facto de também exprimir o seu amor dessa forma? Claro que não, muito pelo contrário.
Tudo isto deixa-me a pensar que continuam a existir demasiados tabus e que é em parte por culpa deles que as pessoas são tão ignorantes e preconceituosas.
Não posso terminar sem chamar a atenção para o seguinte: miséria é viver sem saber como dar e receber amor; é passar pela existência sem experimentar os inócuos e soberbos prazeres partilhados com paixão. Miséria é vivermos sem nos rendermos e entregarmos, com amor, a comunhões sublimes.

Ana Amorim Dias

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Quatro anos - 12 de Setembro

Quatro anos

Sentei-me e comecei. O que não sabia é que não mais iria parar.

"A chuva batia nas velas com crescente intensidade e vagas ferozes irritavam a obstinada resistência daquelas madeiras, maduras de tantas batalhas vencidas.
- Não me levas a melhor, pelas barbas de Neptuno!- gritava, rindo, Sebastien, comandante improvável daquele galeão pirata.
Provocado pelos elementos, com a adrenalina em crescendo, Sebastien rejubilava de excitação e contentamento.
- Mantenham-se firmes. Façam-se à vida nesta luta injusta, pois só olhando a morte de frente podemos saborear o gosto pela vida!"

Eram umas nove (ou dez?) da noite quando a minha primeira história iniciou o seu parto. E isso aconteceu precisamente (só hoje me apercebi) com águas a rebentar; com um naufrágio.
Faz esta noite quatro anos que comecei a escrever. Não consegui voltar a parar. Creio que tal jamais será possível.
Quatro anos. Cinco livros. Sete histórias. Cerca de novecentas crónicas. Poemas. Canções. Artigos. Entrevistas. Uma vida inteira em quatro anos.
Conheci muitas pessoas pelo caminho. Descobri melhor outras que pensava conhecer. Vivi coisas que não me teria lançado a viver se não fosse para as descrever. Procurei. Descobri. Descobri-me. Faço-o todos os dias.
Agora sou mais mulher. Sou mais homem. Mais anciã. Mais criança. Mais pessoa e mais humana.
Ao longo destes quatro anos desenvolvi o raciocínio, aprendi sobre a coerência, agucei a curiosidade, a emoção, a sensibilidade. Tornei-me melhor, sei que sim.
O sabor perfeito trazido por tudo o que evoluí só pode ser melhorado pela vossa presença constante. Desde quem já me acompanha e inspira há anos, até quem só há pouco tempo "chegou", são todos vocês a outra metade do "combustível" que me move.
Por estarem aí, o meu sentido obrigada.
E agora venham mais quatro!

Ana Amorim Dias



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Sobre energia e géneros

Sobre energia e géneros

Li. Voltei a ler. E ainda tornei a somar de novo as letras em palavras e as palavras em frases, atenta a todo o contexto, para ver se teria compreendido bem ou se uma interpretação errónea estaria a ser por mim dada àquilo que o emissor escrevera. O texto defendia que as mulheres são sempre (repito: sempre) exploradas, quanto mais não seja emocionalmente, pelos homens; preconizava que a mulher é sempre (!) esvaziada de si pelo sexo oposto.
Pensei em responder, queria comentar, mas abstive-me de o fazer. Preferi ponderar bastante antes de dissertar sobre o tema. E optei por fazê-lo em sede própria: não em "casa alheia" e sim no sereno conforto do meu próprio espaço virtual.
Entristece-me profundamente que haja mulheres tão revoltadas contra os homens. Talvez tenham sofrido demais às mãos de alguns, mas o certo é que o sofrimento não deveria ter o poder de toldar a lucidez lógica e cristalina do raciocínio. A maldade não escolhe géneros. O todo não pode ser julgado pela parte. E o "sempre" é demasiado absoluto para ser levianamente usado.
Sou mulher e, sim, vejo a minha energia constantemente "ao serviço" de vários homens. Bem como a tenho amiúde "à disposição" de muitas mulheres. Ser pessoa, ser humano, ser social, implica a troca energética. Inevitavelmente. De milhões de maneiras diferentes.
Bem sei que, infelizmente, há muitos tipos de hediondos crimes cometidos contra mulheres, um pouco por todo o mundo, a todo o instante. Mas também muitos há contra os homens. E a desumanidade não escolhe géneros, volto a repetir. Já vi muitos homens a adorarem e respeitarem mais a Mulher (em geral) do que muitas mulheres têm a capacidade de fazer.
"Sempre emocionalmente vampirizadas"? Não! De forma alguma! Num contexto de existências comuns e desligadas de patologias psicológicas, a mulher não vê a sua energia roubada, esvaziada ou vampirizada. Pelo contrário, dá-a de boa vontade, com amor, a outros homens e mulheres. Da mesma forma que o homem a dá, também, com amor, a outros homens e mulheres.
Ser humano é isto: dar e receber energia. E devia ser também ter a capacidade de perdoar e não ter um rancor tão imenso que se estende a um género inteiro...

Ana Amorim Dias

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Enviado via iPad

Anjos

Anjos

Vi recentemente imagens, captadas pela câmara de vigilância de uma qualquer estrada (segundo dizem) chinesa, que mostram um anjo a salvar um ciclista de ser atropelado. À primeira vista, por mais incrível que possa parecer, o vídeo aparenta uma legitimidade inegável. E à segunda e terceira também. Rapidamente surgem vozes a contestar a veracidade do que se vê. Cabe-nos a nós decidir se estamos ou não a ver um anjo em ação ou se aquilo é apenas produto de algum engenhoso técnico de imagem.
Neste caso em particular é-me indiferente a veracidade do que vi: tão feliz fico por ter de facto visto um anjo como por ter observado o produto do trabalho de alguém decidido a fazer crer ao Mundo que os anjos estão entre nós. O esforço de alguém assim só me confirma o que já sei: existem anjos, sem dúvida. Basta recordarmos as simples situações em que a nossa irritação se desvanece perante a presença de alguém (muitas vezes a última pessoa que esperaríamos ser capaz de o fazer) que nos acalma.
A todos os anjos da minha vida, visíveis e invisíveis, a minha gratidão infinita!

Ana Amorim Dias

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Vitimização

Vitimização

Tenho que me controlar bastante quando vêm fazer o papel de vítimas para junto de mim. O primeiro instinto é fazer uso do velho sábio par de estalos, mas depois recordo-me que as ofensas à integridade física constituem crime e que a violência não costuma ser solução para nenhum caso (imaginem então usá-la ao lidar com maníacos da vitimização!)
Não digo que essas pessoas não tenham também a sua dose de problemas, sofrimentos e injustiças; não digo sequer que não se possam queixar um pouco da vida e suas maldades, mas fazer disso uma bandeira e escolher sentir uma constante pena de si mesmas só piora tudo.
Os maníacos da vitimização nem se devem certamente aperceber que o começam a fazer com uma constância e veemência tais que se viciam em buscar o sentimento de piedade por si em todos com quem se relacionam. Mas o pior de tudo é quando se trata de pessoas absolutamente saudáveis, inteligentes e capazes, com vidas que fariam a inveja de muitos!

- Deixa-te de merdas!! Tu já viste bem que blá, blá, blá, blá, blábláblá? - e vou enumerando todos os pontos positivos de que me consigo lembrar, sempre com a sensação de que um bom par de nalgadas devia fazer melhor efeito.
E fico a perguntar-me como se "trata" esta maleita da vitimização. Como se pode fazer com que quem sofre deste mal se liberte dele? Explicando os factos? Fazendo ver que se se optar pela atitude de guerreiro se tem muito mais hipóteses de ser feliz? Argumentando que nada do que de mal se possa passar é uma ofensa pessoal e específica à sua pessoa?
Tenho aprendido a lidar com muitos tipos de gente e diferentes problemáticas, mas confesso que a vitimização me põe os nervos em franja. Acho que se me impõe a atitude guerreira também para aprender a lidar com tais casos...

Ana Amorim Dias


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