(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

17.9.12

O monstro das alfarrobas



- Ana!... –
Oiço a voz muito ao longe.
- Ana! –
Desço do alto mais  profundo  dos confins do meu sono.  
- Olha para a porta. Depressa! –
Pressinto a urgência. Manejo as pálpebras. Abro os olhos.
A porta do meu quarto dá diretamente para a rua. De Verão fica aberta de par em par. Olho para a rua e lá está ela, corpo na rua, cabeça cá dentro. Por momentos fico com a sensação de que mais uns segundos e acordaria com a Joaquina II a lamber-me os pés.
  O momento em que cruzamos aquele  olhar intenso dura muito pouco tempo, mas consigo interpretar o que me veio dizer com a sua expressividade quadrúpede de burra bem instalada na vida.
- Afasta-te do que é meu, sua monstra das alfarrobas! – Diz-me,  antes de se virar para continuar o seu dia. E eu fico ali, estendida nos meus aposentos invadidos pela recriminação contida no olhar de uma burra justiceira.  
- Realmente ela tem razão, Ana. Tu podes comer toda a comida humana que te apetecer…  porque  que é que tens de ir roubar as alfarrobas à burra e às éguas?  - Pensei.
   A verdade é que não sei.  Continuo em busca da resposta enquanto escrevo esta crónica… e vou ruminando uma maravilhosa alfarroba.
Ana Amorim Dias