(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

27.9.11

Lições

Percorri  o caminho de casa às escolas dos miúdos em absoluto estado de graça. Com o pequenino a “espiar” os meus cabelos através de um grande canudo de coloridas cartolinas e o grande a ralhar com ele por saber que o meu feitio, logo pela manhã, não costuma ser dos mais católicos…
   Não me irritei, longe disso! Ouvi a cantilena que o pequeno terrorista entoava, enquanto ouvia, também, a Amy numa das suas divinas interpretações. A estrada de província onde habitualmente nos cruzamos com galinhas e perdizes, estava banhada pelo sol de um dia que se antecipa quente e calmo.
 Mas a história não se fica (como poderia?) nesta bucólica descrição…
 Depois de deixar o Tomás na sua escola, aproximo-me da escola do João e vejo uma menina a pé, pela mão de um adulto,  a dirigir-se também para a sua vida académica. Vejo-lhe um sorriso lindo a vir directamente para o banco de trás do meu carro. Um sorriso que brilha com a mesma intensidade do sol que me veio a brindar todo o caminho.
- “ Que linda, João! E estava a olhar para ti, viste?”
- “ Vi! É a minha namorada… a Bia!”
- “ Mas tu não namoravas com a Carlota?” -  Perguntei-lhe intrigada.
- “ Sim! Mas agora tenho duas namoradas!” – A naturalidade da sua resposta assombrou-me.
-“ Como podes fazer isso, João? E se elas descobrem?...”
- “ Ó mãe, não percebes nada! Elas sabem que sou namorado das duas! Elas são amigas e almoçamos sempre os três juntos…”
- “ Ai credo que a criança já é bígama….” – pensei alarmada.
  Não sei se comecei a ver tudo a andar à roda ou se o Mundo voltou ao seu estado natural, ao ouvir  o sereno discurso de um miúdo de seis anos!  Será que a ordem natural das coisas é mesmo cada um ter direito de amar quem ama, sem julgamentos e recriminações? Será que a sabedoria inocente das crianças é pervertida, com o tempo,  pelos “valores” profundamente enraizados nos adultos? Ou será que que são eles os pervertidos e nós os inocentes??
   Por mais que levante aqui uma tormenta mais perigosa que as do Cabo da Boa Esperança, acho que  uma criança de seis anos é sempre inocente e sábia. E se eles se entendem assim, porque não aprender com isso? Porque não aprender com um tipo de “amor” sem posse nem despotismo?  Se calhar no Mundo ideal, naquele que talvez um dia as crianças Cristal, crianças Indígo ( e tantas outras) venham a criar, seja um receptáculo de novas formas de amor… mais puro e amplo; mais esclarecido e superior… Porque ninguém devia pôr limites aos amores  que se sente por outros seres humanos… E porque, por mais voltas que se dê, ninguém é de ninguém!
Ana Dias

Sem comentários:

Enviar um comentário