(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

20.7.12

O fogo de todos por todos



    Nos poucos dias em que levo sombrinhas para a praia,  adoro ficar mesmo perto do mar mas hoje acho que abusei. Não medi bem a subida da maré que, ao fim de algum tempo, se começou a aproximar perigosamente da exagerada quantidade de coisas que trouxemos. Iniciei então a contrução de um dique de areia,  obra a que os outros três adultos e cinco crianças se juntaram. Rapidamente tinhamos uma contingência de construção semimegalómana a dezoito mãos. Um arrepio emocionado percorreu-me a alma: a bricadeira interativa entre nós, o mar e a  areia ganhou um sentido mais profundo que me lembrou da importância suprema da entreajuda.
   Enquanto íamos construíndo os três diques sucessivos para proteger o “forte”,  fui olhando para a assustadora nuvem de fumo que se mantém  a oeste, vinda do enorme fogo que continua a lavrar a norte de Tavira. Ao vê-la não é alma que se me arrepia, é mesmo a pele. Há oito anos, exatamente por esta altura, vivi a experiência mais assustadora da minha vida. Ficou-me gravada a fogo, um fogo que ardeu lá na  quinta e que se continua a acender em medo de cada vez que o perigo ardente se aproxima.  De tudo o que de mau já vivi, tenho a certeza que este episódio foi o único que até hoje ainda não consegui superar e “resolver”, não obstante ter-me trazido a certeza de que não fico parada perante nada.  Apesar da passagem dos anos não terem apagado em mim o ardente medo do fogo descontrolado,  mantenho a memória de todos quantos se juntaram àquela terrível luta, porque foi nessa noite que aprendi que há quem venha para ajudar; há quem, sem esperar nada em troca, dê mostras inesquecíveis de altruismo e solidariedade, que nada mais são que outras formas de amor ao próximo.
   Os três diques de nada serviram contra a força do mar crescente e acabámos por ter que mudar a parafernália toda uns bons metros mais para cima, mas creio que as cinco crianças se aperceberam bem do valor do “todos por todos”. Às vezes as lutas que travamos não bastam para proteger o nosso “forte” mas, enquanto a solidariedade e amor ao próximo existirem, existirá sempre também a força para nos voltarmos a erguer das cinzas. 
   Por tudo isto não posso terminar sem referir que o meus pensamento e orações estão com todos os que, neste momento, se encontram a lutar,  “ todos por todos”,  contra as chamas.
Ana Amorim Dias