Hoje, enquanto tomava a minha meia de leite escura no café onde costumo ir aos sábados de manhã, reparei num homem. A princípio não me chamou a atenção, a não ser, talvez, pelo seu ar simples e desleixado. As roupas, demasiado pequenas para o seu anafado corpo, davam-lhe o infantil ar de quem jamais se admira ao espelho. Quando já estava prestes a ir-me embora, o senhor tirou um caderno (daqueles de escola, pequeno, de capa preta) e e deixou deslizar as páginas que vi preenchidas pela sua caligrafia azul. Já presa àquela visão, admirei-o enquanto tirava a tampa à esferográfica ( uma bic de ponta grossa como havia antigamente) e a começou a fazer deslizar, sábia, pelas páginas finais daquele pequeno caderno. Mas o que me deliciou… o que me tocou verdadeiramente… foi o sorriso sereno que se lhe colou ao rosto. Reconheci, na serenidade plena daquele sorriso completo, o meu próprio sorriso quando, envolta no burburinho que sempre me rodeia, mergulho na magia das palavras que a criatividade me dita...
Naquele momento lembrei-me de umas palavras do Osho: “ Um criador tem de parecer tolo, tem de arriscar a sua respeitabilidade… é por isso que os poetas, pintores, bailarinos e músicos nunca são pessoas respeitáveis…” E, agora que penso nisso, acrescento para mim mesma: “ a criação põe-nos esse sorriso pateta nos lábios… deixa-nos os olhos com brilho… como aconteceu àquele homem que esta manhã vi escrever….”
Ana Dias
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