(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

4.12.12

Tão torta!



     
       O João andava impaciente à espera do irmão mais velho.
- Óh mãe, mas onde é que está o Tomás?-
- Já te disse, foi ao treino. -
- E demora? -
- Pelo menos mais uma hora… -
- Mãe? –
- Hã?.. –
- Uma hora é quanto tempo?  -
- Dois episódios do Sponge Bob! –
- Hum… -
   Estranhei a impaciência e só quando o Tom chegou, preparado para meter mãos ao trabalho de fazer a árvore de Natal é que percebi tudo. Tinha-lhes prometido que este ano a missão era só deles. E devo acrescentar que foi com muita resistência que lhes acedi ao pedido. Gosto de preparar tudo eu mesma para o resultado ser, no mínimo, perfeito.  Todos os anos, mais ou menos por estes dias,  decoro a casa com todo o rigor e ao som de músicas de Natal. Delegar foi uma decisão muito difícil e algo dolorosa.
- Tu fazes a árvore e eu o Presépio! – Determinou o pequeno ditador dirigindo-se ao irmão.
- Calma! Hoje a árvore e amanhã o Presépio… e só depois de jantarmos! – Impus.
E assim foi. Enquanto eu arrumava a cozinha,  ia espreitando o desenrolar dos acontecimentos pelo canto do olho, com um misto de apreensão e orgulho. O João aninhou-se no sofá, demitindo-se do poder de participar na montagem e decoração da árvore por pura teimosia, mas o Tom, todo contente, rodeou-se de todas as diferentes decorações e deu largas à sua arte.
- Tomás… os ramos têm que estar mais afastados e farfalhudos, não? – Comentei.
- Que séca! – Queixou-se, apesar de seguir a exigência.
   Momento depois vi-o a culminar a missão, colocando   a estrela no topo da árvore,  e fui ver o resultado.   Tudo numa só cor. As luzinhas bem espalhadas. Ri-me com a escolha dos enfeites: optou pelos  mais fáceis, claro!  Mas a verdadeira cereja no topo deste “bolo” natalício foi a acentuada inclinação da árvore!  Como vou aguentar um mês a olhar para algo tão torto??
 “ Tem calma, Ana… Nem assim ela está tão torta como tu tens o feitio!”  - Disse de mim para mim.
Abracei o meu filho mais velho e dei-lhe os parabéns pelo seu excelente trabalho e, em silêncio, congratulei-me a mim mesma por estar a conseguir delegar algo tão importante, passando à nova geração a solenidade destes grandiosos rituais.
  Agora vou comprar papel pardo para a base do Presépio… pois esta noite  outro ensinamento me espera!
Ana Amorim Dias