(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

18.6.14

A minha patroa e eu

A minha patroa e eu

"Faz isso!"
"Já faço, agora não me apetece!"
"Ana, isto tem que ser feito, sabes disso!"
"Eu sei, agora cala-te."
"És mesmo insubordinada!"
"E tu és prepotente. Já disse que faço, mas tem que ser quando me apetecer, senão não fica nada de jeito."
E a Ana patroa cala-se, entendendo a razão que se encerra nos argumentos da Ana subordinada.

Pergunto-me amiúde se me faria bem passar alguma vez pela experiência de ter um patrão. Nunca tive que ceder, laboralmente, a qualquer autoridade. Sou eu que dito as regras, que imponho os prazos, que organizo o trabalho, a orientação, o contexto, o ritmo, tudo. Sou eu que invento os meus projetos e que decido se este ou aquele serviço é para aceitar ou rejeitar. Sou eu que me amanho com a ausência de lucros, com o trabalhar para aquecer ou com as grandes vitórias que por vezes também chegam. Mas pertencer a estruturas hierarquizadas sem estar eu no topo da cadeia seria, aposto, um problema bastante grave pois não sei existir sem poder de decisão. Tivesse eu que estar a fazer o que me mandassem, sem o instinto predador a soltar-se em cada ação, e a vida perderia grande parte do seu brilho.

No meio de tudo isto sei que tenho uma sorte incrível, construída pelas minhas próprias mãos durante toda a vida adulta. É claro que ser "subordinada" de uma patroa louca, que não tem a mínima noção de que o meu corpo tem limites, exige muito de mim. Mas também entendo que ser patroa desta artista frenética é tudo menos uma "pêra doce". Talvez por isso tenhamos aprendido a amenizar, amiúde, as nossas discrepâncias, partilhando calmamente uma boa caneca cheia do apaziguador café.

Ana Amorim Dias

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