(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

10.3.14

A vitrine de Marraquech

A vitrine de Marraquech

Quando vi esta vitrine, numa loja em Marraquech, senti um asco enorme. Ainda assim fotografei-a, considerando que talvez um dia a imagem me fosse útil. Não me enganei.

- Oh mãe, quem era aquele senhor da televisão?
O João gosta de conversas sérias nos pequenos-almoços à mesa, mas eu não entendi a pergunta.
- Qual senhor, filhote?
- Aquele, ontem à noite, com quem tu te "passaste"...
Eu sabia que não devia ter chamado nomes a alguém encaixotado no ecrã. Muito menos em frente aos miúdos.
- É uma das muitas pessoas que, servimos-se da sua posição de poder, tem roubado o nosso país, meu amor. E, como se não bastasse, ainda tem o descaramento de vir para a televisão "arrotar a postas de pescada".

Sim, ontem fui pouco civilizada ao insurgir-me, exaltada, contra o homónimo do meu filho mais novo, de um tal clã Soares. Não bastasse o pulha senil do seu pai ter acenado (desde o púlpito da sua "fundação", também ela gamada ao país) num hipócrita apoio aos manifestantes, ainda veio o fedelho dessa fétida oligarquia de compadrios, debitar bacoradas tão asquerosas quanto os dentes da vitrine de Marraquech.
Desconfio que a vergonha na cara não os assiste. Nem a eles nem aos colegas de outras "devoções" ideológicas. É que, por mais que nos identifiquemos com comunismos, socialismos ou sociais democracias, todas as ideologias políticas têm as suas vantagens. E as suas falácias, claro, sendo que a maior de todas elas é serem, a maior parte das vezes, "pregadas" por corruptos que apenas defendem o mandamento da entrada de riquezas nos seus bolsos.

O dito asqueroso veio proclamar, referindo-se aos agentes da autoridade, que tem um profundo respeito por "esta gente"! Eu não queria acreditar! "Esta gente"?? Podia ser mais perjurativo que isto? Podia ter, perante eles, ainda mais soberba? E estava eu engasgada na minha indignação quando o voltou a referir: "esta gente", sem se aperceber sequer com que altivez os estava a diminuir. Não bastasse já a precária situação em que se encontram nem o difícil papel tanto dos manifestantes como dos que mantinham a ordem.
É deplorável a situação em que se encontram? Sem dúvida! Como deplorável é a situação de todos e do próprio país. Mas esse "senhor" que se lembre que as culpas não morrem solteiras e que, se estamos como estamos, também à sua "nobre" família o podemos agradecer. Não venha é para a televisão passar-nos o atestado de burros!
E de repente a vitrine de Marraquech deixou de me parecer tão asquerosa. Vá-se lá entender porquê.

Ana Amorim Dias

1 comentário:

  1. Isto é muito mais das atrocidades que sofremos neste momento e desde o chamado 25 de Abril. ..

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