(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

10.2.14

O fato-tipo-escafandro

O fato-tipo-escafandro

"Onde é que está o limpa pára-brisas agora? O Rodrigo tinha razão, um capacete integral era capaz de dar mais jeito do que este de cross, sem viseira. E um fato-tipo-escafandro também dava jeito."
- Queres adiar a aula?- tinha-me ele perguntado há minutos.
- Não. Não está a chover assim tanto.- eu não estava disposta a adiar a minha terceira aula por nada deste mundo!

"Pois, o que dava mesmo jeito era um limpa pára-brisas para óculos escuros... Bem, mas ainda dá para ver." Para me tranquilizar decidi mudar de pensamento. "Waow! Já vou a trinta!!"
Olhei para o asfalto a deslizar sob mim e não consegui impedir-me: "Será que doía muito se me espantanasse a esta velocidade?" Nunca o chão me pareceu tão duro!
"Deixa-te de imbecilidades, parvalhona! Não vais cair, tens é que te concentrar, certo?", "Sim, claro, é isso. Então vamos lá. Apertar a embraiagem e toques do pé esquerdo para cima: toca a animar isto!"
Quarenta à hora. Bem, quase.
- Ana, agora vamos entrar na rotunda e sair na segunda saída, dando os piscas.- o Rodrigo soou-me ao ouvido, através do walkie-talkie.
"Vamos? Ah, pois, vamos... Quer dizer, vou eu, não é?? Porque estou entregue a mim mesma!! Ai caraças, como é que se reduz, mesmo? Ah, sim, mudanças para baixo uma a uma e usar mais o travão de pé porque está a chover."

Algum tempo depois parámos numa estradita paralela e sem trânsito.
- Ana, no carro o que é que tu fazes antes de meter mudanças superiores?
- Sei lá, guio por instinto! "Que é o que eu quero fazer com a mota e ainda não consigo!!"
- Tens que puxar um bocado pelo carro para ele estar pronto para receber bem a mudança seguinte, certo?
Percebi onde é que ele queria chegar. Eu parecia uma tartaruga coxa que nem sequer acelerava para passar à mudança seguinte.
- Agora metes primeira e vais fazer um "U" para começarmos a treinar os "8". - disse-me com naturalidade.
- Oitos? Hum.- dei uma gargalhada interior. Repleta de sarcasmo, claro. "Oitos?? Porque é que não pedes logo oitocentos?? Estás louco ou quê? Ainda nem 100 minutos guiei no total e queres oitos???" Eu a pensar isto tudo e ele a olhar para mim, a sorrir.
- Vais até ali e dás a voltinha para trás sem pôr os pés no chão.-
"Como é bom perceber que há gente mais doida que eu!" pensei, antes de me lançar à tarefa.
Não consegui mas não andei muito longe, quem sabe na próxima aula.
Voltámos à base e acho que já vim mais solta e feliz. "Hum...Isto é tão bom... Pena ainda o fazer tão mal.", "Tem calma, parvalhona, como é que queres ter instinto em 100 minutos de prática?", "Pois, realmente...".
Guiei todo o caminho até à escola de condução a sentir-me mesmo feliz. "Ninguém nasce ensinado e isto não está a correr assim tão mal...", "Sim, mas algo me diz que correria bem melhor se tivesse as aulas como o fato-tipo-escafandro."

Ana Amorim Dias

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