(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

26.12.13

Estupidamente simpáticos

Estupidamente simpáticos

Saí do carro à pressa depois de um estacionamento à campeã de rali. Vinha com uma urgência enorme de começar a escrever.
O tema foi fermentando ao longo dos últimos dias: porque é que as pessoas não são mais simpáticas? Porque é que eu, que acho que sempre o fui, agora estou muito mais?

- Oh Ana, até há pessoas que dizem: "hum, aquela pessoa é demasiado simpática, há qualquer coisa que não está bem..." - dizia-me uma amiga, ontem ao jantar, quando lhe comentei o facto.

Se calhar é isso. Há um certo medo em revelar toda a simpatia. Há receio de nos entregarmos aos outros. Porque os mal entendidos existem e porque essa entrega implica uma energia que muitos não estão dispostos a gastar.

Estou muito mais simpática, agora. A Ana escritora está-se a borrifar para os olhares desconfiados dos desconhecidos a quem sorri. A Ana caçadora de histórias sabe-se verdadeira nesta simpatia brutal, incomodativa talvez, que espalha por quem apenas conhece. Sim, porque os amigos, esses, aturam-nos tudo com a sapiência do amor.
Dou comigo a pensar: "eh pá, isto não será demais?" E respondo-me: "Não sejas estúpida, tu és escritora e podes. Além do mais o que é sincero e bom nunca pode ser demais."

Estava, há pouco no banho, quando novos factos se somaram à divagação. Constatei que todos os meus novos (e antigos) amigos motards são de uma simpatia para além de explicações.
O Marco e o José, por exemplo, conheci-os na apresentação do "Olho Ubíquo" no moto clube de Faro. A conexão foi imediata. Partilhámos apenas alguns minutos das nossas vidas, mas sei que da próxima vez que os vir a simpatia vai estar lá. Inteira. Soberba.
Tenho descoberto que esta "estirpe" da estrada tem um modus vivendi muito próprio. Os motards entregam-se em simpatia e conexão verdadeira porque sabem tudo sobre a emoção. E sabem o valor de cada vida humana. Quando se entregam a abraços viris, apenas cinco minutos depois de conhecerem alguém, fazem-no com a força do pacto: "tu és meu irmão". E isto enternece-me e faz-me dar-lhes um valor que jamais saberei colocar em palavras...

Faz-nos falta simpatia. Faz-nos falta paixão pela vida. Faz-nos falta perceber o valor de cada vida que se cruza connosco. Senão pela humanidade, pelo menos por vocês, façam como os escritores loucos e como os príncipes das duas rodas: sejam estupidamente simpáticos, pelo menos de vez em quando.

Ana Amorim Dias


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