(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

7.1.14

Ainda há tempo

Ainda há tempo

Faltavam dez minutos para começar a apresentação do livro na biblioteca.
- Olha! Esqueci-me de pintar as unhas!-
O Eric andava entretido com o técnico, à volta de cabos, ligações e testes de som e imagem. Ignorou-me por completo, claro. Creio que isto é normal nos homens: nem mesmo os que têm uma enorme sensibilidade artística conseguem perceber a crucial importância de umas unhas bem pintadas.
Sei que nem a inteligência nem o dom da palavra me entram pelas unhas através do verniz mas, talvez por ser tão manualmente expressiva, adoro tê-las bem arranjadas sempre que falo em público.
- Dez minutos dá mais que tempo!- disse baixinho. Sentei-me no chão e comecei.
Aí sim, prendi a atenção do fotógrafo das tribos perdidas, que largou o que estava a fazer e se agarrou à Leica para capturar o momento, provavelmente pensando: "que espécie de género é este, capaz de se pôr a pintar unhas a uma hora destas?"

Anda-me a incomodar um bocado, a mania que as pessoas têm de começar a desejar "Bom Ano" ainda antes do Natal. Para mim só faz sentido fazê-lo no dia 31 de Dezembro! Porquê? Bem, porque as coisas só acabam no fim, não há porque desistir antes. Porque, quando eu publicar esta crónica, o ano de 2013 ainda vai ter cerca de 36 horas nas quais tudo pode acontecer; trinta e tal horas nas quais podemos fazer tantas coisas quantas a nossa vontade determinar.
Desejarei um bom ano amanhã, quando este estiver quase esgotado. Hoje a mensagem é outra: é a de que ainda há tempo para uma infinitude de coisas. Ainda temos tempo para fazer o balanço das conquistas e das oportunidades que, por receio, perdemos. Ainda há tempo para aquele telefonema, para aquele abraço, para aquele café que anda "pendurado" há meses. Ainda há tempo para nos encantarmos, para inspirarmos alguém, para demonstrarmos amor ou dizer o que não foi dito. Ainda há tempo para encher bem os pulmões e cantar a viva voz uma canção inventada, para dançar onde quisermos ou fazer figura de urso. Ainda há tempo para rir e arrancar gargalhadas, para pagar aquela conta, ou maravilhar alguém com uma inesperada atitude. Ainda há tempo para criar, para tomar decisões, para perguntar e responder; para ser sincero, para acreditar que tudo é mesmo possível.
Sim, trinta e tal horas são tempo mais do que suficiente para dar mais sentido à vida... e para pintar as unhas, claro, que entrar no novo ano de unhas mal "amanhadas", nem pensar!

Ana Amorim Dias

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