(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

17.11.13

Muitos milhares de manhãs

Muitos milhares de manhãs

Tentei conter-me e não comentar as observações infelizes da escritora cor de rosa. Criticar e julgar não são as minhas actividades favoritas; gosto de dar o benefício da dúvida, reclamando que, se calhar, se explicaram mal ou houve alguma falha no entendimento. Perante o "tareão" que a colega estava a levar, até senti vontade de a defender... mas primeiro quis ver a tal entrevista.
Realmente a culpa do estado da nação não pertence só aos cabecitas (ia escrever cabecilhas mas nem vale a pena) de agora. Vem de há muitos, muitos anos, e reparte-se por tanta gente que, a serem responsabilizados, teríamos que criar muitos mais "postos de reclusos VIP". Mas um escritor (UM ESCRITOR!!!) acreditar na falta de civismo e inteligência de quem reclama os seus direitos??? A incredulidade invadiu-me! A questão ultrapassa classes, a meu ver. Mesmo quem é privilegiado, por sorte ou trabalho árduo, e continua a ter alguma qualidade de vida, não pode fechar os olhos, inerte, a tanto desgoverno e injustiça! Pelo contrário, é quem tem mais voz e alicerces que se deve insurgir e apoiar quem se insurge.
Estou com todos os que, sacrificando-se um pouco mais, aderiram hoje à greve. Estou com todos os que, sem se poderem sacrificar mais, optaram por não a fazer. Mas não posso defender quem, do alto do seu conforto, se "borrifa" para as pessoas! Sobretudo se é escritor(a); sobretudo se pertence àquele conjunto de seres para quem as PESSOAS devem ser o princípio, o meio e o fim de toda a sua existência.

Dou-me conta que, em breve, chegarei ao milhar de crónicas. Tenho-as escrito diariamente ao longo dos últimos anos, quase sempre de manhã. E hoje acordei a lembrar-me da Xerazade, que contava as suas histórias à noite, todas as noites, para salvar as suas compatriotas.
Quantas manhãs terei eu? Quantas mais crónicas escreverei? Alguma vez me faltará voz à pluma? E que efeito têm elas, essas palavras sentidas que a cada amanhecer me dão um renovado entendimento de tudo? Talvez não salvem a vida a ninguém, como acontecia com as histórias da Xerazade... Ou talvez ajudem muitas pessoas a ser um pouco mais felizes, não sei...
As pessoas e a vida, são o barro dos escritores, mas apenas as pessoas são o derradeiro destino das obras que deles nascem. Como pode um escritor não saber ser tolerante, compreensivo e amante de cada Ser? Não entendo. Ainda. Porque, pelas minhas contas, tenho pela frente muitos milhares de manhãs!

Ana Amorim Dias

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