(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

24.11.13

O meu rolo na parede

O meu rolo na parede

Se a crónica de hoje tiver alguma "moral da história", começarei a crer que não há impossíveis. Então vamos lá!

Eram quase duas da tarde quando dei por mim a inventar letras de músicas pimba e a proferir piropos às paredes. Como é que cheguei a isto?
...Tudo começou quatro horas antes...

Num minuto pensava que trabalharia toda a manhã à secretária e, no seguinte, vi-me com uma trincha na mão a pintar acabamentos numa divisão da casa. Segui um impulso estranho e avancei. Mas depressa constatei que havia muito mais para pintar. Troquei de roupa, fui buscar o escadote e pensei: "Vou pintar isto tudo!"
É tramado pensar isto. É muito cansativo medir forças com paredes de reboco irregular e com a nossa própria teimosia. Mas aproveitei o tempo para refletir. Sem pausas. Sem medos. Era só eu, a tinta e as paredes (ok,ok, e o rolo, os pincéis, o escadote, o pano para limpar as borradas, blábláblá).
Um dos debates mais interessantes que tive comigo foi o do perfecionismo versus o "bora lá despachar". Não é caso para ter carteira profissional, mas pinto paredes desde miúda e posso dizer que sei o que faço. Só que ontem, contra os meus próprios instintos de demorado esmero, obriguei-me a um ritmo célere e, simultaneamente, a um trabalho que não envergonhasse o melhor pintor de construção civil do mundo (também me perguntei quem será ele e o porquê de não aparecer em entrevistas nos jornais e na tv).
À medida que as paredes iam mudando de cor, fui constatando que a coisa até nem estava a correr assim tão mal, apesar de ter ficado com tinta desde a sola das botas até à sobrancelha direita (literalmente).
Depressa e bem não há quem? Qual quê! Com um empenho concentrado e motivado, tudo pode acontecer!
Mas vi que estava a abusar de mim mesma quando, já quase no fim, comecei a "descompensar" e a cantar alto músicas pimba inventadas no momento sobre a vida dos pintores (Óh Sr. Quim, se precisar de letras novas é só dizer!). Alternava as ditas cantigas com expressões como: "Anda cá parede, deixa-me esfregar-te o meu rolo"... Perante o abanar de cabeças, condescendentes, de outros trabalhadores que esporadicamente passavam por mim, entendi que estava na hora de pousar o meu rolo e ir almoçar.
Vida de pintor não é fácil, mas isto é como tudo: há que passar por elas para saber dar valor.

Ana Amorim Dias

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