(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

10.7.12

Marcados




   Olho para a minha mão pousada no volante. Um pouco acima do pulso, reparo na marca de uma queimadura feita ao tirar pizzas do forno, no dia 21 de Abril por volta da hora do almoço. Lembro-me da data porque estava a preparar a festa de anos do  João.  E também me lembro que quando me queimei  levei o braço à boca e, com a minha saliva, melhorei instantaneamente.  Mas a queimadura ainda deve ter sido de monta, para se notar a marca passado tanto tempo.
    Fico a pensar nas marcas que todos temos. No corpo e na alma. Marcas suaves ou brutais. Bem visíveis ou invisíveis. Marcas que ficam para sempre ou que, num sopro mágico, se perdem nas brumas da soma de novos dias.     Penso nas marcas boas e nas más; nas dolorosas e nas que quase nem sentimos.  Penso nas memórias de dias felizes;  nas trágicas quedas que deixaram cicatrizes e nos ferros em brasa que marcaram os nossos corações com as iniciais eternas de quem já amámos...
    Será importante termos a plena consciência e lembrança de cada marca em nós?  Será importante recordarmos em que circunstância e data elas se gravaram na nossa pessoa?  Devemos preservar essas marcas como uma importante parte de nós ou tentar camuflá-las com mil subterfúgios?
    Creio que não temos escolha: somos feitos células marcadas pelo devir da vida; feitos dessa matéria intangível a que chamamos alma, que grava cada marca. Para sempre.  Boa ou má. Há que aceitá-lo apenas. Porque existir sem ter marcas seria como banir as estórias que escrevem a nossa história. Porque nem toda a saliva do mundo, por mais que nos aplaque a dor, consegue apagar aquilo que nos marcou.
Ana Amorim Dias
     

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