Passei os anos de faculdade a ouvir, uma e outra vez, que mais vale um mau acordo do que uma boa demanda. Mais tarde vim a perceber que esta espécie de provérbio jurídico nem sempre corresponde à verdade. E se assim é no contexto dos enredos judiciais, sinto-me com legitimidade suficiente para o derrubar por completo se o tentar aplicar à vida em geral.
Senão vejamos: o que é a vida? Partindo da mais básica e irrefutável premissa, ela é, nada mais e nada menos, que o intervalo entre o nascimento e a morte. E o que se passa ( ou se deveria passar) nesse intervalo é uma incessante demanda: a demanda da felicidade. Podemos procurá-la de todas as maneiras possíveis e sob todas as formas de que ela se pode revestir e, enquanto nos conseguirmos manter focados nesse imperativo supremo, podemos dizer que a nossa vida é uma Boa Demanda.
O que não percebo é porque é que milhões de pessoas se permitem a uma rendição constante e sucessiva aos maus acordos! Fico com a ideia de que, na nossa essência, trazemos instalado o gene da Boa Demanda, mas que, ao longo desse intervalo de tempo que é a vida, nos vamos acomodando aos maus acordos, por nos trazerem uma sensação entorpecedora de segurança e estabilidade.
Aceitamos maus acordos em tudo. Nas relações interpessoais, nos ofícios, nos estilos de vida e na forma como escolhemos encarar as nossas existências. Aceitamos os maus acordos porque temos um medo visceral da Boa Demanda, esse bicho tenebroso que nos obriga a arriscar tudo a todo o momento. Não abraçamos a Boa Demanda pelo medo de perder, sem perceber que, ao fazê-lo, estamos a perder à partida tudo o que realmente importa.
Há Vidas vencedoras e vidas perdidas. Nas primeiras vive-se a arriscar a nossa suprema demanda, mesmo sabendo que aqui e ali se perde; nas outras, nas vidas desperdiçadas, passa-se por cá sem perceber que muito mais vale viver na demanda da felicidade, com todos os riscos e perdas que daí podem resultar, do que numa sequência constante de bons e ocos acordos.
Ana Amorim Dias
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