(...) e a confiança cega
que tenho na minha verdade
não a detém quem me nega
as asas da liberdade ...

Ana Amorim Dias

7.12.12

Chá de Lello


   Pela primeira vez quase me esqueci de sair do avião. É o tipo de coisa que  acontece quando a melhor amiga está sentada ao nosso lado e o Mundo inteiro se resume àqueles momentos que roubámos só para nós.
   Pela primeira vez nos confundem com um casal.
- Desejam o quarto com cama de casal ou camas individuais? –
- Camas individuais. – Respodemos em coro com um ar divertido, rindo-nos da naturalidade com que as diferenças são agora encaradas.
   Pela primeira vez deixamos tudo para trás e verificamos a compatibilidade viajeira de duas pessoas tão diferentes e, ainda assim,  tão complementarmente compatíveis.
  Gastamos as solas das botas como se não houvesse amanhã. Gastamos as palavras como se não quiséssemos deixar palavra alguma por dizer.  Passeamos sem olhar ao tempo, desrespeitando horários alimentares e prestando a devida homenagem a uma amizade de várias décadas.
   E então paramos num dos únicos locais que eu fazia realmente questão de conhecer. Entramos como quem entra num templo. Respiramos o ambiente mágico do espaço. Subimos a escadaria encantada. Convido-a para um chá e sentamo-nos, em plena livraria Lello, uma das mais belas do mundo. Beberricamos o líquido negro e quente, e olhamos uma para a outra num silêncio cúmplice e reverencial.  E é então que percebo que somos mesmo um casal. Um caso de amor amigo, platónico e sagrado. E é então que percebo que há momentos eternos:  tão serenos e perfeitos que se conseguem contruir apenas com chá e silêncio.

Ana Amorim Dias