Conheço-a há mais de trinta anos e, durante todo este tempo, sempre a vi a viver uma paixão feita tanto de alegrias como de amargos dissabores.
A minha mais antiga e constante amiga, com a sua personalidade alegre e expansiva, infelizmente não é perfeita. Ela é, como o próprio filho afirma, “da lagartagem”!
Sempre a vi a seguir o seu amado clube, contra tudo e contra todos; a sofrer como uma condenada em jogos mais importantes; e a manter-se fiel a esse tão grande amor. Em alturas mais críticas, e dando provas da mais sólida amizade, cheguei a sofrer ao seu lado e a gritar de alegria por o Sporting marcar ( perdoem-me mas a amizade vem primeiro!).
Mas quis o destino ( ou o pai da criança, por certo ) que o Afonso, seu filho, lhe saísse das entranhas, qual profanador hospedeiro, com o mais vermelho sangue a latejar-lhe na alma. Assim que as enfermeiras o deitaram no berço pela primeira vez, o seu pai cobriu-lhe o franzino corpo com as vestes benfiquistas, selando um pacto irreversível.
Com a chegada do entendimento, ao ser questionado sobre o local de nascimento, respondia com voz fanhosa:
- No xtádio da Uuz. –
- Não, meu anjo! Foi no HOSPITAL da luz! – corrigia-o a mãe.
- Nã foi nada! Foi no xtádio da Uuz!! -
Mas isto é só um exemplo da sua encarnada paixão. A minha pobre amiga tem que ouvir o cd do Benfica a toda a hora, com o acérrimo adepto a cantar tudo de cor e com uma convicção invacilável.
Mas foi apenas há dois dias que a Margarida me confessou o inconfessável ( mas prometam manter o segredo, que não lhe quero manchar a imaculada reputação sportinguista, ok?)
- Sabes, comecei a levá-lo à escolinha do Benfica. Se visses a alegria dele, todo equipado a rigor e a jogar “ à séria”… Juro-te, Ana, nunca tinha visto o meu filho tão feliz em toda a vida. –
Eu não respondi nada porque lhe vi um orgulho no olhar que não achei nada normal. Afinal conheço-a há mais de três décadas e somos mais que unha e carne. Olhei um pouco mais para aquele olhar com 20% de tristeza e 80% de alegria. Não precisei que ela me explicasse mais nada. Ali estava eu, perante uma mãe cujo filho é da equipa rival, que falava do seu pequeno “arqui-inimigo” cheia de alegria e orgulho por o ver tão decidido e feliz.
– “ Assim são os filhos” - pensei, - “ os reis de um amor maior!”
Ana Dias
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