Nenhuma pessoa possui outra. Excepto talvez os escritores.
Nenhum escravo foi jamais do seu “dono”. Nenhum amante foi jamais do seu amor. Ninguém pode ser verdadeira e completamente possuído por outro alguém. A menos que tenha o pesado fardo de fazer parte da vida de quem faz da vida as palavras. Aí sim, é-se possuído. Integralmente e sem defesa possível.
Não há antídoto capaz de parar tal domínio. Não há apelo, calado ou surdo, que trave o roubo dessas almas que os escritores podem vestir com as vestes que quiserem, nomear com o nome que escolherem ou com o sexo que desejem. Quem convive com um escritor, nasce e renasce, em tantas personagens quantas ele entenda; com tantas nuances quantas as que ele em si veja; com tantas cores, odores e sabores quantos os que ele lhe sinta. Quem convive com escritores carrega um dos mais pesados fardos que um ser humano pode ter: perde o domínio de si.
Li algures que quem ambicione a imortalidade deve ser amado por um escritor. É a mais pura verdade. A menos que a humanidade se extinga, essas pessoas ficarão para sempre. Para sempre conservadas nos laboratórios da escrita.
- Tem cuidado com ela. Distrais-te um bocadinho e faz mil estórias contigo. – Comentam, às vezes, de mim. E eu sorrio.
- Tem cuidado com ela. É como um vampiro que te vai sugar as entranhas. – É o que me dá a ideia de ouvir. E eu sorrio. Sorrio do meu poder. Não sou dona de ninguém, mas sei que todos possuo.
Ana Amorim Dias
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